Inteligência artificial no Direito chegou para ficar

Inteligência artificial no Direito

Ferramentas, com o passar do tempo, somente tornarão a rotina dos advogados mais prática e eficiente

Estudos especializados no tema já estão prevendo que até 2025 os escritórios de advocacia e as diretorias jurídicas de empresas enfrentarão um ponto de inflexão com a consequente automatização de um vasto número de postos de trabalhos ocupados por advogados em todo o mundo.

Não é mistério que a irrupção da Inteligência Artificial está alterando, em um ritmo exponencial, a forma pela qual a maioria das atividades e ocupações cotidianas vêm se desenvolvendo nas últimas décadas.

Resumidamente, a Inteligência Artificial, que surgiu na década dos anos 60, consiste em replicar diversas operações da mente humana que permitem desenvolver, produzir e acumular raciocínios aprendidos ao longo do tempo pelo ser humano com um alto grau de velocidade e eficiência. Isto é feito por meio de uma série de algoritmos matemáticos ou estatísticos que podem exercer e completar tarefas que até recentemente eram desempenhadas exclusivamente pelo ser humano.

Atualmente, a Inteligência Artificial está começando a transformar a profissão de advogado de diversas formas. Esta transformação está sendo feita por meio da melhoria da eficiência do processo de pesquisa, análise de documentos e classificação de dados, sistematização da revisão de artigos doutrinários, jurisprudência e precedentes, minimização de erros nos processos de produção de relatórios e documentos e, em geral, por meio do auxílio na redução da quantidade de tempo e recursos dedicados a tarefas de natureza mecânica e repetitiva. Com isso, os profissionais do direito estão passando a ter maior disponibilidade para se dedicar a tarefas de alto valor agregado e, consequentemente, aumentar a produtividade dos serviços por eles oferecidos.

O volume e a velocidade com que as informações e dados são atualmente criados e circulados, somados à incapacidade do advogado de ter acesso de forma produtiva e eficiente a todo esse conteúdo no âmbito jurídico, fazem com que a Inteligência Artificial tenha um campo fértil para uma expansão relevante. Nesse sentido, vale ressaltar que, segundo estudos, cerca de 20% (vinte por cento) do tempo médio das atividades de um profissional do direito são gastas em pesquisas jurídicas.

Diante do exposto acima, a pergunta mais recorrente entre os advogados é se devemos nos preocupar com a Inteligência Artificial. Sempre que o nosso setor profissional está diante destas novas tecnologias, surgem perguntas e dúvidas sobre como elas afetarão as operações diárias e nossas carreiras profissionais. É evidente que a atividade legal não está imune a esta tendência tecnológica e que, mais cedo ou mais tarde, a forma como os advogados desenvolvem seus serviços sofrerá determinadas mudanças derivadas substancialmente da irrupção da Inteligência Artificial. Esse medo recorrente diante de uma nova tecnologia é parecido à resistência que tivemos anos atrás quando ingressaram no mercado softwares jurídicos e ferramentas de gestão.

A verdade é que nem estas tecnologias nem os softwares jurídicos tornarão os profissionais do direito menos competentes. Na realidade, estas ferramentas, com o passar do tempo, somente tornarão a rotina dos advogados mais prática e eficiente, permitindo-lhes perder menos tempo com tarefas meramente operacionais e focar seus esforços e tempo em tarefas estratégicas e de alto valor agregado.

Nesse sentido, a possibilidade de fornecer serviços legais com maior eficiência e menores custos é um aspecto que, em princípio, deveria ser bem recebido pelo ambiente jurídico. No entanto, cabe destacar que certamente observaremos um impacto nos níveis de recrutamento dos escritórios e das diretorias jurídicas de empresas que hoje operam com base em metas, orçamentos e indicadores de rentabilidade, os quais buscarão prestar seus serviços de maneira alinhada aos objetivos estratégicos das empresas e/ou das unidades de negócio que assessoram.

Diante deste panorama, existe um enorme desafio e tarefas a serem cumpridas pelos profissionais do direito, tais como:

Para os recém-formados em direito e que iniciam esta profissão tão digna, o treinamento e o desenvolvimento de habilidades e talentos estão cada vez mais focados em áreas de maior valor agregado, ficando em um segundo plano as operações mecânicas, de memória ou meramente administrativas.

Para os profissionais do direito na procura de oportunidades de crescimento, é essencial a compreensão e o gerenciamento de novas tecnologias disponíveis, de forma que estas contribuam para a melhoria da sua produtividade e não sejam uma tentação para sua substituição.

Para aqueles que lideram equipes de advogados em escritório ou diretorias jurídicas de empresas, é fundamental o desenvolvimento de uma estratégia clara que permita incorporar tecnologias, mantendo um equilíbrio entre eficiência, produtividade e talento.

Em razão da própria natureza humana e talvez pelo ego que normalmente habita nos profissionais do direito, sempre tentaremos nos enganar ao acreditarmos que somos insubstituíveis e que não existe software no mundo capaz de competir com o nosso critério legal e com a nossa capacidade analítica e estratégica desenvolvidos ao longo dos anos de profissão. No entanto, todos os dias a realidade nos mostra que nossas crenças estão sendo desafiadas pelos avanços da ciência e da tecnologia, nos demonstrando que o verdadeiro talento consiste em ser capaz de se adaptar, incorporar estas novas tendências ao nosso dia a dia e tirar o melhor proveito delas para o nosso benefício.

Dessa forma, para seguirmos avançando com sucesso, não devemos insistir na negação dos benefícios trazidos pela ciência e tecnologia, e muito menos persistir em uma batalha da qual provavelmente não sairemos vitoriosos. Muito pelo contrário, devemos nos aproveitar de todos os benefícios e melhorias proporcionados por estes avanços, buscando sempre nos adaptar às alterações produzidas no âmbito jurídico.

Gabriel Kuznietz – sócio do Demarest.

Fonte: Jota